sábado, 24 de junho de 2023

Príncipe Valente (1954): De Henry Hathaway, Uma Clássica Adaptação Cinematográfica Oriunda dos Quadrinhos.



O cinema frequentemente tem levado adaptações dos quadrinhos para o cinema. Não é de hoje este casamento (algumas vezes desencontrada) entre a Sétima Arte e os gibis. Aliás, isso já era levado, de certa forma, para o cinema antigo, através dos seriados das matinês, onde se viu personagens como Flash Gordon, Fantasma, Super-Homem, Mandrake, entre outros.

Histórias em Quadrinhos dO PRÍNCIPE VALENTE
Hal Foster, o criador de PRÍNCIPE VALENTE.
Mas o que dizer de um personagem criado em 1937 por um desenhista muito conceituado com a finalidade de leva-lo para as tiras de jornais aos domingos? O desenhista em questão é o magistral Hal Foster (1892-1982), o mesmo que desenhou também para as tiras dominicais as histórias de Tarzan, e o personagem é PRÍNCIPE VALENTE. Foster elaborou uma novela tendo um jovem príncipe como protagonista, com enredo contínuo e destaque para o realismo dos panoramas, com narrativa mais sofisticada que o habitual no universo dos quadrinhos, sendo muitas vezes também bem humorada. Até hoje, as tiras de PRÍNCIPE VALENTE são publicadas semanalmente em mais de 300 jornais americanos, de acordo com sua distribuidora, a King Features Syndicate. Foster, ao não usar os "balões" para os textos, retomou o estilo dos primeiros quadrinhos ao mantê-los na parte de baixo de cada quadro. Os acontecimentos mostrados são historicamente precisos, mas de períodos históricos bem distintos que vão desde o antigo Império Romano à Alta Idade Média, com algumas poucas ambientações em tempos mais recentes.

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Os traços de Príncipe Valente, por Hal Foster. Acima, reprodução de uma das tiras dominicais, e os demais personagens que cercam em suas aventuras nos quadrinhos.
Príncipe Valente nos tempos do Rei Arthur (Prince Valiant in the Days of King Arthur) foi sucesso nos grandes jornais pela parte do mundo, chegando a imprimir 4000 tiras em quadrinhos, publicadas aos domingos. Até o Duque de Windsor considerava Príncipe Valente como uma grande contribuição para a literatura inglesa. E também pudera: o trabalho de Hal Foster no mundo das Histórias em Quadrinhos é considerado como uma das melhores no ramo, seja pela narrativa, pela arte, ou pelo enorme rigor e fidelidade à verdade dos ambientes (humanos, culturais e naturais) mostrados. 

POSTER ORIGINAL

PRÍNCIPE VALENTE (1954): Um dos primeiros filmes rodados em CinemaScope. Foto durante sua premiere no Chinese Theatre, em 1954.
Entretanto, somente dezessete anos depois, em 1954, que o personagem criado por Hal Foster assumiria vida no cinema. Nesta época, o revolucionário CinemaScope procurava filmar grandes produções para justificar este novo formato, e viram que PRÍNCIPE VALENTE (Prince Valiant) seria o espetáculo perfeito para se aproveitar o bom uso da tela e suas qualidades panorâmicas, como já havia sido feito em O Manto Sagrado em 1953, o primeiro filme lançado por esta inovação cinematográfica.

Darryl F. Zanuck, Chefe da 20th Century Fox e um dos idealizadores do filme.
Jeffrey Hunter, o primeiro ator apontado para o papel de Príncipe Valente
O magnata chefão da 20th Century Fox, Darryl F. Zanuck (1902-1979) investiu neste novo épico extraído dos quadrinhos de Hal Foster junto ao produtor Robert L. Jacks (1927-1987), e acreditou que pudesse conseguir o mesmo êxito de The Robe no ano anterior. O papel do herói de Foster já estava destinado para o mais promissor galã do estúdio, Jeffrey Hunter (1926-1969), mas este tinha um “rival” na mesma empresa, o jovem Robert Wagner, que tinha na época 23 anos. Hunter acabou perdendo o papel e Wagner assumiu o personagem Príncipe Valente.

Robert Wagner ficou com o papel do herói criado por Hal Foster, muito embora o desenhista considerasse o perfil do jovem ator imaturo para o personagem.
O roteirista Dudley Nichols, que adaptou para o cinema PRÍNCIPE VALENTE (1954), fugindo dos propósitos de Hal Foster.
Hal Foster chegou a declarar, tempos depois, sobre o que achou do filme e da atuação de Wagner: O rosto dele era imaturo. Ele corria pra todo lado com a boca aberta. Mas apesar de tudo, gostei, foi uma boa experiência. “De certo modo”, não tive nada a ver com o filme. Primeiro me enviaram um roteiro e me pediram que eu melhorasse, fazendo sugestões, mas eles devem ter perdido minha carta. Depois me pagaram um salário fabuloso para eu ir até lá (na Inglaterra, onde grande parte do filme foi rodado), mas eu sabia que não tinha nada a dizer, que só me desapontaria, pois nada que eu falasse ou fizesse mudaria o padrão de Hollywood.

O cineasta Henry Hathaway, diretor de PRÍNCIPE VALENTE (1954).
Franz Waxman, músico que compôs a trilha para o filme.
Entretanto, sabe-se que cinema e quadrinhos são artes bem distintas, e na maioria das vezes, adaptações cinematográficas saídas de gibis tem tudo para dar mais errado do que certo. Contudo, se considerarmos que Príncipe Valente pudesse ter um argumento que deixasse a desejar, em contrapartida do primoroso elenco que o cerca, entre mortos e feridos, a fita não se sai mal, graças à bela fotografia do competente Lucien Ballard (1904–1988) e da direção clássica de um cineasta renomado como Henry Hathaway (1898-1985). Hathaway tem um currículo que comprova sua versatilidade como um dos grandes artesãos de Hollywood. Em Príncipe Valente, ele testifica isso cabalmente, com uma realização que mesmo tendo suas adversidades técnicas e desencontro de duas mídias distintas (como são os quadrinhos e o cinema), soube guiar com estilo primoroso esta superprodução.

ROBERT WAGNER

O Príncipe Valente (Robert Wagner) e seu interesse amoroso na aventura, a Princesa Aleta (Janet Leigh).
As filmagens externas foram rodadas na Inglaterra entre a Primavera e o Verão de 1953, enquanto as internas foram realizadas em estúdios na Califórnia, no Outono de 1954. Contudo, mesmo o CinemaScope pode ter suas limitações se o espetáculo não seguir suas particularidades essenciais. O filme limita-se a paisagens e cenários bem decorativos, mas segundo a crítica americana da época, resultou num espetáculo vazio, distanciando-se muito do conceito movies, que era pelo menos tão particular no cinema americano na época, onde se perde o que há de história e anedótico. Dudley Nichols (1895–1960), costumeiramente um excelente roteirista (No Tempo das Diligências), perde-se no argumento, querendo elevar Valente como um príncipe cristão em defesa da fé, o que foge dos conceitos originais propostos por Hal Foster, que em suas histórias originais utiliza muito da mitologia nórdica e de elementos pagãos. Neste quesito, o que era para ser uma aventura adaptada aos moldes dos quadrinhos passa a ser uma aventura épica com divulgação religiosa.  Mas há de se entender dos motivos que levaram Nichols a escrever uma história simples, já que as tiras dominicais de Foster são bem mais densas. Entretanto, uma qualidade a se acrescentar é a trilha sonora de Franz Waxman (1906-1967), que já abre o espetáculo com a arte de Hal Foster estampada em sua apresentação. 

A Camelot de PRÍNCIPE VALENTE (1954).
Valente, perante a corte do Rei Arthur e dos Cavaleiros da Távola Redonda.
Sir Kay (Tom Conway) e Rei Arthur (Brian Aherne)
Da esquerda para a direita: Ilene (Debra Paget), Princesa Aleta (Janet Leigh) e seu pai, o Rei Luke (Barry Jones), Rei Arthur (Brian Aherne) e sua Rainha Guinevere (Jarma Lewis).

O elenco em grande parte tem seu primor. Bob Wagner, galã com talentos limitados, que muito embora começasse no cinema, é bem melhor aproveitado na TV, tornando-se futuramente astro das séries O Rei dos Ladrões (1968-1970) e Casal 20 (1979-1984). O próprio ator reconheceu em seu livro de memórias que a escolha para ele viver Príncipe Valente foi inadequada. O resto do cast parece se entreter melhor do que o próprio âncora da fita, afinal, temos que admitir que a história foi bem escolhida, onde se tem um conto de fadas a moda americana da década de 1950, com o heroísmo, o mocinho, o vilão, a virtude castigada, muitas lutas, e finalmente, o bem triunfando sobre o mal.  Temos Janet Leigh (1927-2004) como a Princesa Aleta, interesse amoroso de Valente. Um notável vilão como James Mason (1909-1984), que rouba a fita de cena a cena. Um gigante como Sterling Hayden (1916-1986) perfeito no papel de Sir Gawain. E ainda, Donald Crisp (1882-1974) como o Rei Aguar, pai do herói, e Victor McLaglen (1886-1959) como um poderoso Viking. E não se pode esquecer de Debra Paget, que mesmo em sua estonteante beleza, pouco faz no filme a não ser se apaixonar pelo personagem de Hayden. A produção  é ainda valorizada pela narração britânica do ator Michael Rennie (1909-1971), de O Dia em que a Terra Parou  (1952).
James Mason (como o vilão Sir Brack) rouba o filme de cena a cena com sua magistral atuação. 
Sterling Hayden, ótimo como Sir Gawain.
Debra Paget, que quase não aparece na fita, como Ilene. 

A Trama

O Rei Aguar (Donald Crisp) e sua família viking se tornaram cristãos, e por isso são vítimas de traição e fogem para o exílio, ficando sob a proteção do Rei Arthur (Brian Aherne, 1902-1986) e dos Cavaleiros da Távola Redonda. Quando atinge a maioridade, o filho de Aguar, Príncipe Valente (Robert Wagner), é enviado pelo seu pai à corte do Rei Arthur, para se tornar cavaleiro. Ao chegar à praia, ele é atacado por um misterioso Cavaleiro Negro. Consegue fugir e chegar até Camelot, onde se apresenta ao Rei Arthur. Pedindo para ser cavaleiro, o rei lhe põe aos cuidados do Cavaleiro Sir Gawain (Sterling Hayden), para treina-lo como escudeiro.


Valente se encontra com Sir Gawain (Sterling Hayden), que o treina para escudeiro.
O misterioso Cavaleiro Negro.
Valente e Sir Brack (James Mason).
Valente se apaixona pela Princesa Aleta (Janet Leigh), mas terá que enfrentar as artimanhas de outro Cavaleiro da Távola Redonda, Sir Brack (James Mason), que mais tarde, Valente descobre que é o misterioso Cavaleiro Negro. Este manda os pais e a amada de Valente para uma prisão viking, onde o herói consegue resgata-los com a ajuda de um aliado da família, o também viking Boltar (Victor McLaglen). Valente então volta a Camelot para acertar as contas com Sir Brack, em um duelo decisivo, perante o Rei Arthur e os Cavaleiros da Távola Redonda.

Valente e sua amada Aleta.
Aleta e Valente, capturado pelos vikings
O viking Boltar (Victor McLaglen) é amigo de Valente, que o ajudará a libertar seus pais e Aleta da prisão.
Enfim, o duelo decisivo entre Valente e Sir Brack.
Certamente, Príncipe Valente, produzido há mais de 60 anos, é digno do espetáculo, sendo um cinema para adultos por seu aspecto de nostalgia recompondo a História em Quadrinhos (mesmo com algumas imperfeições, porém mantendo as características), mas que tem capacidade de agradar também ao público juvenil, que talvez nunca tenha lido as tiras dominicais do personagem. Seja como for, é um filme importante por ser um dos primeiros a serem produzidos pelo CinemaScope, e por também tratar-se de uma das primeiras adaptações extraídas dos Quadrinhos para o cinema contemporâneo, algo raro nas produções da década de 1950. PRÍNCIPE VALENTE estreou nas salas do Cinema Palácio, Centro do Rio de Janeiro, nas férias escolares de Julho de 1954. 

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ROBERT WAGNER É O PRINCIPE VALENTE

O jovem príncipe, agora sagrado Cavaleiro da Távola Redonda como Sir Valente.
Seja como for, é um filme importante por ser um dos primeiros a serem produzidos pelo CinemaScope, formato de tela que acabou revolucionando toda a estética da Sétima Arte.

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DIVULGAÇÃO PELOS JORNAIS

PRÍNCIPE VALENTE foi exibido nos cinemas de todo o Brasil em 1954. No Rio de Janeiro, conforme as divulgações da época, estreou no Cine-Palácio, Centro da cidade, em julho do mesmo ano.

FICHA 
TÉCNICA
País – Estados Unidos
Ano – 1954
Gênero - Aventura\ Épico
Direção – Henry Hathaway
Produção – Robert L. Jacks, para a 20th Century Fox
Roteiro – Dudley Nichols, baseado nas Histórias em Quadrinhos de Hal Foster.
Música – Franz Waxman
Fotografia – Lucien Ballard, em Cores
Metragem - 100 minutos.

POSTER ORIGINAL
Elenco
Robert Wagner – Príncipe Valente
James Mason – Sir Brack
Janet Leigh – Princesa Aleta
Sterling Hayden – Sir Gawain
Debra Paget – Ilene
Victor McLaglen – Boltar
Donald Crisp – Rei Aguar
Brian Aherne – Rei Arthur
Barry Jones – Rei Luke
Mary Philips – Rainha de Thule
Tom Conway – Sir Kay
Hal Baylor – Guarda da Prisão
Primo Carnera – Rei Sligon
John Dierkes – Sir Tristam
Don Megowan – Sir Lancelot
Michael Rennie – Narrador


sábado, 17 de junho de 2023

Doutor Jivago (1965): A Epopeia Romântica e Política em uma saga soviética de David Lean.


Doutor Jivago (Doctor Zhivago), produzido em 1965, tem a fama de ser um dos filmes mais suntuosos que a Sétima Arte já produziu, e também não foi para menos.  Precisou-se de quase três anos de preparos ao custo de 11 milhões de dólares. Todavia, o filme arrecadou só no mercado norte-americano 46, 5 milhões de dólares, e ainda arrebatou os Oscars de melhor roteiro adaptado (Robert Bolt, 1924-1995), melhor foto em cores (Freddie Young, 1902-1998), melhor música (Maurice Jarre, 1924-2009 – com o famoso “Tema de Lara”), melhor cenografia em cores, e melhor vestuário em cores.

SAGA PARA UMA REALIZAÇÃO CINEMATOGRÁFICA

Produzido em plena Guerra Fria, Doutor Jivago serviu de propaganda anticomunista por mostrar os horrores da Revolução Bolchevista que promoveu o povo russo à pobreza e a miséria, sujeitando à frieza e o autoritarismo dos líderes revolucionários.

O Cineasta David Lean (1908-1991)
Sob a direção do austero cineasta inglês David Lean (1908-1991), este fez questão de rodar sua superprodução na Espanha (imitando a Russia) e na Finlândia (passando pela Sibéria). Aliás, a Espanha sempre foi o clássico refúgio dos cineastas e produtores cinematográficos, pois era mais lucrativo para a contenção de despesas, assim, a Metro-Goldwyn-Mayer, produtora do filme, escolheu o local para a rodagem desta grande superprodução.

Lean entre Geraldine Chaplin e Julie Christie, as estrelas de DOUTOR JIVAGO (1965)
Geraldine Chaplin e Julie Christie, em uma foto durante intervalo de filmagem.
Lean escolheu precisamente a cidade de Sória (Espanha) para o início de seu épico. Daí veio algumas complicações, pois o local é uma das regiões mais frias do país, muito embora não fosse problema em obter caracteristicamente neves “russas”. Entretanto, em fins de janeiro de 1963, frio e inverno como é em toda a Europa, a neve não resolvia aparecer, e o elenco se sentia desanimado. Nisto, uma bela nevada veio a ocorrer, dando início, finalmente, as filmagens.

Omar Sharif durante uma pausa nas filmagens, em Madrid.
O Cast magnífico de DOUTOR JIVAGO (1965) no friorento inverno europeu.
David Lean se entregou de corpo e alma ao trabalho, justificando cem por cento sua fama de extrema meticulosidade e concentração em sua metodologia de trabalho.  O cineasta fez questão de recriar o caráter exato dos personagens de acordo com o livro de Boris Pasternak, partindo do princípio que os tipos descritos no romance eram gente comum, apanhados dentro da engrenagem da revolução e sofrendo as consequências dos fatos. Assim, para Lean personifica-los nas telas de cinema, os atores tinham que ser bem especiais, para assim confeccionar sua saga soviética com proporções bem épicas a altura de um grande espetáculo.


O LIVRO DE BORIS PASTERNAK

O filme de Lean, em seus 197 minutos de projeção, comprime-se com o volumoso romance (publicado em 1957) do russo Boris Pasternak (1890-1960), um dos primeiros escritores dissidentes da União-Soviética. Pasternak começou a escrever o romance em 1946 e levou dez anos para concluí-lo. Ao terminar, ficou inseguro se devia publicá-lo, pois a obra contrariava as normas ditadas pelo governo soviético para a literatura.

BORIS PASTERNAK, o autor do romance DOUTOR JIVAGO, iniciado em 1946 e concluído em dez anos depois.
Sem condições de publicar seu romance em terras soviéticas, o livro foi publicado na Itália a 23 de novembro de 1957, conseguindo rápida notoriedade em 1958, quando lhe foi conferido o Premio Nobel de Literatura. Infelizmente, por imposição do Kremlin, Pasternak não pôde aceitar a láurea, pois caso fizesse, isso poderia levá-lo à detenção em um campo de trabalho forçado na Sibéria. 

Boris Pasternak (1890-1960) poeta e romancista russo, Prêmio Nobel de Literatura em 1958, não pôde aceitar a premiação.
Na Rússia, Boris é mais conhecido como poeta do que como romancista, em virtude de o livro Doutor Jivago não ter feito sucesso na antiga União Soviética por motivos obviamente políticos. É interessante observar, no entanto, que o personagem principal, homônimo ao livro, é justamente um poeta, que tem problemas com as autoridades soviéticas, embora simpatizante da causa dos deserdados. Assim, é possível afirmar que Doutor Jivago é o alter-ego do próprio autor do romance, Boris Pasternak.

Exemplar americano de uma edição do romance DOUTOR JIVAGO, de Boris Pasternak, publicado durante o embalo do filme, em 1966.
A obra literária foi proibida na União Soviética até 1989, quando a política de abertura de Mikhail Gorbachev liberou a publicação do livro. Somente a partir daquele ano, os russos puderam conhecer a saga de Jivago através da literatura. Boris Pasternak morreu a 30 de maio de 1960 de câncer de pulmão, sem poder assistir ao estrondoso sucesso da adaptação cinematográfica de seu famoso e imortal romance. 

DAVID LEAN, O SENHOR DOS ESPETÁCULOS
David Lean, o diretor de DOUTOR JIVAGO (1965)
Robert Bolt, escritor e roteirista, que deu vida ao
script de DOUTOR JIVAGO (1965)
O fotógrafo Freddie Young que realizou um trabalho competente de fotografia para DOUTOR JIVAGO (1965)
O produtor Carlo Ponti (1912-2007) adquiriu os direitos do romance de Pasternak para as filmagens deste grandioso espetáculo, contratando o roteirista Robert Bolt para editar o script, que o fez em 224 páginas. David Lean se encarregou de concretizar um grande elenco internacional, sendo Doutor Jivago o terceiro título da última fase de sua carreira marcada de superproduções espetaculares, desde A Ponte do Rio Kwai (1957), passando por Lawrence da Arábia (1962), e culminando com A Filha de Ryan (1970). Ou seja: foram apenas quatro filmes em 13 anos, todos detentores do Oscar, muito embora o período de maior prestígio crítico de David Lean seja seus trabalhos anteriores realizados em sua pátria natal, como Desencanto (1945), Grandes Esperanças (1947), Oliver Twist (1948), e Sem Barreiras no Céu (1952).

O Compositor Maurice Jarre escreveu a partitura de DOUTOR JIVAGO (1965), e o "Tema de Lara"  ganhou o Oscar por Melhor Composição.
David Lean comandando a direção durante as filmagens.
Com exceção de A Ponte do Rio Kwai, as outras três superproduções dirigidas por Lean contaram com a colaboração do roteirista Robert Bold para o argumento, além do fotógrafo Freddie Young, e do compositor Maurice Jarre. E como os demais superespetáculos dirigidos por Lean, bem assessorados por uma competente equipe onde estão inclusos um inteligente roteirista, um fotógrafo brilhante, e um compositor magistral, também não poderia deixar de ostentar um elenco All Star para dar vida cinematográfica ao romance de Boris Pasternak

O ELENCO
Omar Sharif como o DOUTOR JIVAGO (1965)
Para encarnar o papel-título, caracterizado pelo seu desprendimento das coisas, refinamento e nobreza, a escolha recaiu sobre Omar Sharif (1932-2015), ator de grande força e presença.

Geraldine Chaplin, sensacional como a esposa de Jivago, Tonya.
Geraldine Chaplin foi convocada para viver Tonya, esposa de Jivago, mas não demorou, suscitou imediatamente uma onda de comentários maldosos. Segundo as más línguas (e infelizes!), o único mérito da atriz era por ser filha de Charles Chaplin (1889-1977) e que toda sua arte resumia-se nisto. Contudo, estes boatos foram desmentidos violentamente por David Lean, que afirmou tê-la escolhido pela excelente qualidade de seus testes feitos para o papel antes do contrato.

Julie Christie como Lara, o verdadeiro amor do protagonista.

O terceiro papel importante, o de Lara, outro amor de Jivago, coube a Julie Christie, então nesta época uma atriz muito promissora, com experiência em teatro, e que não tardaria a ganhar o Oscar como melhor atriz, em 1965, pela sua atuação em Darling, a que Amou Demais/Darling, de John Schlesinger (1926-2003), onde posteriormente revelou ser uma artista de grande talento através dos anos.

Alec Guinness, um dos grandes nomes da película, como o irmão de Jivago.
Sir Ralph Richardson, como o pai adotivo de Jivago.
Rod Steiger como o nojento e inescrupuloso negociante Victor Komarovsky
Assim, contratando um elenco de primeira grandeza liderado por um ator de grande porte como Omar Sharif (seu filho, Tarek Sharif, faz ponta no filme como Jivago aos 8 anos de idade), dando uma fabulosa oportunidade a uma atriz como Julie Christie, então quase uma novata – e ainda, chamando uma artista sem nenhuma experiência prévia no cinema como Geraldine Chaplin, o diretor David Lean desmentiu por vez o antigo e arraigado conceito de que só se emprega “rios de dinheiro” num filme que disponha de grandes nomes, verdadeiros chamarizes de bilheteria. Além de Sharif, Chaplin, e Christie, Tom Courtenay, Alec Guinness (1914-2000), Ralph Richardson (1902-1983), Rod Steiger (1925-2002), Siobhan McKenna (1923-1986), Rita Tushingham, e Klaus Kinski (1926-1991), são alguns outros nomes não menos importantes que despontam nesta obra prima da Sétima Arte.

 A TRAMA
Em suas 3 horas e 17 minutos de duração, Lean descreve a saga de Yuri Jivago (Omar Sharif), médico que se casa com uma amiga de infância, Tonya (Geraldine Chaplin), na Moscou do início do século XX, e com ela, vem a ter um filho. Contudo, Jivago se aproxima de Lara (Julie Christie), jovem estudante ligada a um revolucionário idealista, Pavel Antipov (Tom Courtenay), apelidado de Pasha. Mas vem o médico, a saber, que ela é protegida por Victor Komarovsky (Rod Steiger), um nojento e inescrupuloso negociante.  

Jivago e Tonya no meio das dificuldades.
Omar Sharif como o poeta, aristocrata, e médico, Yuri Jivago.
Yuri Jivago, um homem idealista.
Quando Lara decide se casar com Pasha, ela é humilhada e brutalizada por Komarovsky. Quando eclode a Primeira Guerra Mundial, Jivago reencontra Lara, que havia se tornado uma enfermeira voluntária a fim de localizar o marido perdido no front. Com a Revolução de 1917, Jivago se muda com sua família para o vilarejo de Varykino nos Montes Urais, onde tem um encontro com Pasha, agora um oficial desumano e fanático.

O negociante Komarovsky, "protegendo" Lara e sua mãe.
Cansada dos abusos, Lara resolve se vingar de Komavosky.
Julie Christie, em um grande desempenho como a sofrida Lara.
Ainda mais tarde, o médico reencontrará Lara, e se tornam amantes. Compulsoriamente convocados pelos partisans, o médico é liberado, mas descobre que sua esposa Tonya e seu filho voltaram a Moscou. Novamente o destino colocará Jivago junto a Lara, em Varykino.

OS BOLCHEVIQUES - Ao ataque!
A amarga e dura Revolução.
A Guerra Civil entre os exércitos.
Através da saga de Yuri Jivago, a plateia viaja pela transição revolucionária. Inicia-se ainda na Rússia dos Czares, as manifestações populares promovidas pelos bolcheviques, a repressão feroz aos movimentos, a revolução, e o pós-revolução com a guerra civil entre exércitos vermelhos e brancos.

No meio de tanta dor...
existe o momento do amor, e dos reencontros.
Podemos notar também o discurso de crítica ao sistema socialista nas cenas anteriores e posteriores à revolução. Antes da revolução é mostrada uma Rússia com uma aristocracia rica, belos salões, culta e, até mesmo, despreocupada.


Yuri Jivago e sua amada Lara
O casal Yuri e Tonya
Jivago ainda como estudante de Medicina.
O próprio Jivago é um médico e poeta aristocrata de sucesso. Após a revolução, todo o cenário e a sociedade até então elitista, se empobrecem. Inclusive Jivago, que perde as propriedades e acaba pobre e doente. Este percurso da trama descreve o senso comum de que o socialismo divide a pobreza e a miséria, corroborando ser um método político promotor da desgraça.

Yevgraf (Alec Guinness), a procura da filha de seu irmão, que pode ser esta garota (Rita Tushingham)
Lara e sua filha com Jivago, depois desaparecida.
Em meio a dor e ao sofrimento das guerras, uma imortal história de amor.
Mas Doutor Jivago, além de ser uma epopeia política, denunciando os horrores do socialismo, também se concentra na história de amor entre o médico e sua amada Lara, um amor que nunca os une em definitivo, mas sempre em dose de reencontros.  

Doutor Jivago operando um soldado ferido, tendo Lara como sua ajudante.
DOUTOR JIVAGO, de 1965. Direção de David Lean. Uma das obras primas mais suntuosas de toda a História da Sétima Arte.
Assim, a superprodução dirigida majestosamente por David Lean, se propôs com um tremendo clima dramático recriar um épico em que se expôs ao mundo uma visão ciclópica de um caos deliberadamente armado. Uma obra cinematográfica pletórica de tempestades de guerra, de revoluções, de paixões humanas, e da natureza em fúria. Enfim, um grande sucesso do cinema mundial.

Propaganda de um jornal carioca, a 13 de junho de 1966, com intuito de promover o lançamento do filme nas salas de cinema do Rio de Janeiro, com pompas merecidamente devidas.

FICHA 
TÉCNICA

DOUTOR JIVAGO

(Doctor Zhivago)

Pais: Estados Unidos/Inglaterra

Ano: 1965

Gênero: Drama, Romance, Épico

Direção: David Lean

Roteiro:  Robert Bolt, com base em romance de Boris Pasternak

Produção: Carlo Ponti, para a Metro Goldwyn Mayer

Trilha Sonora: Maurice Jarre

Fotografia: Frederick A. Young

Edição:    Norman Savage

Direção de Arte: Terence Marsh, Dario Simoni

Figurino: Phyllis Dalton

Maquiagem: Mario Van Riel, Grazia De Rossi, Anna Cristofani

Efeitos Sonoros: A.W. Watkins, Franklin Milton, Paddy Cunningham

Efeitos Especiais: Eddie Fowlie

Tempo de Duração: 197 minutos 


DIVULGAÇÃO

ELENCO
Omar Sharif - Dr. Yuri Jivago

Julie Christie - Lara Antipova

Geraldine Chaplin- Tonya

Rod Steiger  - Victor Komarovsky

Alec Guinness - General Yevgraf Jivago

Tom Courtenay   - Pasha Antipova

Siobhan McKenna - Anna

Ralph Richardson - Alexander Gromeko

Rita Tushingham - Tonya Komarova

Jeffrey Rockland - Sasha

Tarek Sharif - Yuri, aos 8 anos

Bernard Kay - Bolshevik

Klaus Kinski - Kostoyed Amourski

Gérard Tichy - Liberius

Noel Willman - Razin

Geoffrey Keen - Boris Kurt

Adrienne Corri - Amelia, mãe de Lara


DIVULGAÇÃO


PRÊMIOS

Academia de Artes Cinematográficas de Hollywood, EUA

Oscar de Melhor Fotografia a Cores (Freddie Young )

Oscar de Melhor Trilha Sonora (Maurice Jarre )

Oscar de Melhor Figurino (Phyllis Dalton )

Oscar de Melhor Direção de Arte - Decoração de Cenários (John Box, Dario Simoni, Terence Marsh)

Oscar de Melhor Roteiro Adaptado (Robert Bolt)

 

Prêmios Globo de Ouro, EUA

Prêmio de Melhor Filme - Drama

Prêmio de Melhor Trilha Sonora Original (Maurice Jarre)

Prêmio de Melhor Roteiro (Robert Bolt)

Prêmio de Melhor Direção (David Lean)

Prêmio de Melhor Ator em um Drama (Omar Sharif)

 

Prêmios David di Donatello, Itália

Prêmio de Melhor Direção de um Filme Estrangeiro (David Lean )

David de Melhor Produção Estrangeira (Carlo Ponti)

David de Melhor Atriz Estrangeira (Julie Christie)

 

Prêmios Grammy, EUA

Grammy de Melhor Trilha Sonora (Maurice Jarre)

 

Prêmios Laurel, USA

Prêmio Laurel de Ouro de Melhor Drama







Um Convidado Bem Trapalhão (1968): Blake Edwards faz Peter Sellers promover uma festa de arromba!

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