Charada
(Charade) foi
dirigido por Stanley Donen (1924-2019) em 1963, que também produziu esta que é considerada uma das
aventuras de espionagem mais bem elaboradas de todos os tempos, bem ao estilo
de Alfred Hitchcock. Segundo Donen, Charada
é uma comédia de suspense, concebida um pouco de Indiscreta (uma das grandes obras de Hitch), porém bem mais visual
e trabalhada no plano da estrita mise-em-scène.
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O Cineasta e Produtor Stanley Donen |
Uma
narrativa Hitchconiana com Cary Grant (1904-1986) repetindo seu tipo de papel em
Suspeita (1941) e Ladrão de Casaca
(1955), ambas obras primas da magnificência do Mestre do Suspense, e ainda evocando Vincente Minnelli na
sofisticação da comédia no bom gosto sempre em cena, onde adorna o engenhoso
mecanismo que empurra a ação, de forma desinibida, para o thriller ou para um humor com suspense e exuberância cromática.
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O Diretor Stanley Donen entre Audrey Hepburn e Cary Grant |
Stanley Donen (falecido em 2019) foi uma autoridade dos grandes musicais (Cantando na Chuva, Sete Noivas Para Sete Irmãos), e explora com muita vontade tudo que o script (de Peter Stone, 1930-2003) lhe proporciona. E como tudo de Donen sempre caiu na mais livre imaginação, a fita vai escalando os recursos necessários ao tom do divertimento, inclusive a vantagem de não poupar qualquer malabarismo ou respeito por fatos verídicos.
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Cary Grant e Audrey Hepburn, o casal de CHARADA (1963) |
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Cary Grant e Audrey Hepburn, em frente ao Rio Sena: CHARADA (1963)
A inopinada, fascinante, e feérica desta narrativa de “comédia negra” que não precisaria ir tão longe para usar adequadamente uma fórmula, aprovado dentre os que Hitchcock (talvez o cineasta mais plagiado do mundo) proporcionou aqueles que usaram de seu estilo. Provavelmente, Charada seja o decalque hitchconiano mais assumido, até que Brian de Palma veio praticamente refazer Um Corpo que Cai em Trágica Obsessão, em 1976. Destarte, Donen sorve basicamente o Hitch de Ladrão de Casaca (1955) e Intriga Internacional (1959), cujas relações com Charada se estreitam na presença do mesmo astro principal, Cary Grant, de classe e garbo sofisticado para revestir onde atuou de verniz estilístico, quase inalterável (segundo postura do cronista Paulo Perdigão, já falecido, em crítica sobre Charada ao jornal O Globo, em 25 de agosto de 1985). Quando começa, aliás, com os créditos de Maurice Binder (1925-1991) imitando os de Um Corpo que Cai, Charada já está na trilha certa. Instantaneamente inconfundível. Charada é um redemoinho de truques, trapaças, armadilhas, e reviravoltas. A trama coloca a eterna Bonequinha de Luxo, Audrey Hepburn (1929-1993) no centro de aterradora conspiração de silêncio e ameaças letais.
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Audrey Hepburn é Regina Lampert, uma estilista de férias nos Alpes Franceses. |
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Que de repente, se vê numa intriga de morte e mistério! |
Audrey é Regina Lampert, uma estilista de moda que volta de uma temporada de esqui nos Alpes Franceses. Lá, ela conhece o empresário Peter Joshua (vivido por Grant). Ao voltar para Paris, Regina encontra o marido assassinado. Sozinha, passiva e amedrontada, Regina descobre que o marido, durante a II Guerra, havia roubado 250 mil dólares em ouro da Resistência Francesa, e que uma quadrilha está disposta a recuperar o tesouro, usando de todos os meios para faze-la contar o que ela sabe. A esta altura, Regina e a plateia desconfiam de tudo e de todos, inclusive do próprio Peter (com quem tem um envolvimento romântico), ou do Agente da CIA Hamilton Bartholomew (Walter Matthau, 1920-2000), que é incumbido de resolver o caso.
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Cary Grant é Peter Joshua, que se torna uma espécie de guardião da viúva Regina, vivida por Audrey. De pé, James Coburn. |
O mais
inusitado acontece na cena do velório da vítima. Um dos membros da quadrilha
que estava presente ao evento chega a espetar um alfinete no cadáver para
certificar se está realmente morto. Outra cena marcante é quando uma pistola
apavorante é apontada de perto para Regina, mas quando é disparada, nada mais expele
do que um jato de água. Há muito movimento e correrias neste espetáculo pelas
ruas de Paris, e até uma espécie de brincadeira de “esconde-esconde” pelo metrô.
A verdadeira heroína de toda a história,
Regina, vivida com toda maestria e carisma por Audrey Hepburn, escapa por um
triz de ser baleada por um pistoleiro sob a arcada da ópera, sem contar três
impressionantes assassinatos que tem ao longo da película. São essas mortes o
único desvio que o filme vem a sofrer em relação a linha de franco bom humor.
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Peter Joshua enfrenta um dos temíveis bandidos do filme, vivido pelo grandalhão George Kennedy. |
Seria
necessário tanto sadismo por parte de Donen e de seu roteirista? Quem pode
saber, afinal tudo não passa de uma Charada!
Apesar disso, a trama traz interlúdios alegres. Charada é um filme pândego, com mistura de riso e pavor, muito
peculiar aos trabalhos de Alfred Hitchcock. Cary Grant trava eletrizante luta
com o grandalhão George Kennedy, um homem que tem uma garra de aço no lugar de uma das mãos. Grant como Peter Joshua, deixa a luta como vencedor, mas com aparência de
quem se tivesse visto frente a frente, nas escorregadias telhas, com um
crocodilo feroz. Entretanto, se mostra
valente a ponto de defender Regina do trio violento de assaltantes, vividos por
Kennedy, James Coburn, e Ned Glass. Mas a questão é: será que Joshua não
pretende dar um bote sujo na pobre Regina? Afinal ela é herdeira do viúvo e
Joshua pode pretender pôr as mãos na grana. Será? Quem pode prever? Seria hilário
em vermos Grant como “gatuno” em um de seus últimos filmes.
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Joshua se encontra com os três temíveis vilões, vividos respectivamente por James Coburn, George Kennedy, e Ned Glass. |
Charada foi totalmente rodado em Paris, exteriores e interiores, e até no mercado de Les Halles, hoje inexistente. Mas Donen confessa uma falha: neste passeio de Bateau Mouche, eles iluminaram apenas um dos lados do rio Sena, assim a projeção de fundo das cenas é sempre a da margem direita, nas cenas em que aparecem Cary e Audrey. É aqui que se ouve a famosa música tema de Henry Mancini (1924-1994), que só teve letra de Johnny Mercer (1909-1976) porque era obrigatório para poder concorrer ao Oscar, o que acabou acontecendo.
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A Luta de vida e morte entre Cary Grant e George Kennedy em CHARADA (1963). |
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Após a luta, Joshua é cuidado por Regina de seus ferimentos.
Donen confessa que usou um truque, numa cena logo no início do filme: a mão que segura a pistola é de um homem para não revelar a piada. As cenas iniciais foram rodadas num hotel ainda inacabado em Mégeves, Alpes Franceses. Audrey Hepburn, como sempre, vestia modelos de seu figurinista favorito Givenchy e como era seu hábito tinha três cópias de cada vestido. Aliás, figurinos bem realçados pela fotografia de Charles Lang (1902-1998). Cary Grant, embora não aparentasse, completou sessenta anos durante as filmagens e não queria mais ser galã. Foi por isso que a princípio recusou o papel. Não demoraria muito, Grant se aposentadoria das telas de cinema.
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Waltter Matthau é o Agente da CIA Hamilton Bartolomew |
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Audrey e o ator francês Jacques Marin, como um inspetor rumo as investigações. |
Vale a pena destacar os atores que fazem os vilões de Charada. Muitos destes eram oriundos da televisão e ainda não eram famosos no cinema, como James Coburn (1928-2002), e George Kennedy (1925-2016) que seria ator ganhador agraciado com o prêmio da Academia, alto e forte como um touro, além de Ned Glass (1906-1984), que havia sido carpinteiro depois de ter seu nome manchado na Lista Negra do McCarthismo. Na trilha musical, Henry Mancini franqueia sofisticação extra a um entretenimento impecável, que nem mesmo Stanley Donen logrou igualar, quando fez dois anos depois Arabesque, segundo sua idêntica concepção.
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CHARADA foi título de inauguração do novo CINE-ODEON, localizado na Cinelândia, Centro do Rio de Janeiro, a 17 de dezembro de 1964. |
FICHA
TÉCNICA
CHARADA
(Charade)
Ano de
Produção – 1963
Gênero:
Suspense
Direção: Stanley Donen
Produção: Stanley Donen e James H. Ware, para Universal
Fotografia:
Charles Lang, em cores.
Música:
Henry Mancini.
Roteiro:
Peter Stone, com base em seu argumento.
ELENCO
Cary Grant – Peter Joshua
Audrey Hepburn – Regina Lampert
Walter Matthau - Hamilton Bartholomew
James Coburn – Tex Panthollow
George Kennedy – Herman Scobie
Dominique Minot - Sylvie Gaudet
Ned Glass - Leopold W. Gideon
Jacques Marin – Inspetor Edouard Grandpierre
Paul Bonifas – Mr. Felix
Thomas Chelimsky - Jean-Louis
Gaudet
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