sábado, 8 de julho de 2023

Charada (1963): Uma Trama à Hitchcock dirigida por Stanley Donen.


Charada (Charadefoi dirigido por Stanley Donen (1924-2019) em 1963, que também produziu esta que é considerada uma das aventuras de espionagem mais bem elaboradas de todos os tempos, bem ao estilo de Alfred Hitchcock. Segundo Donen, Charada é uma comédia de suspense, concebida um pouco de Indiscreta (uma das grandes obras de Hitch), porém bem mais visual e trabalhada no plano da estrita mise-em-scène.

O Cineasta e Produtor Stanley Donen
Uma narrativa Hitchconiana com Cary Grant (1904-1986) repetindo seu tipo de papel em Suspeita (1941) e Ladrão de Casaca (1955), ambas obras primas da magnificência do Mestre do Suspense, e ainda evocando Vincente Minnelli na sofisticação da comédia no bom gosto sempre em cena, onde adorna o engenhoso mecanismo que empurra a ação, de forma desinibida, para o thriller ou para um humor com suspense e exuberância cromática.

O Diretor Stanley Donen entre Audrey Hepburn e Cary Grant
Stanley Donen (falecido em 2019) foi uma autoridade dos grandes musicais (Cantando na Chuva, Sete Noivas Para Sete Irmãos), e explora com muita vontade tudo que o script (de Peter Stone, 1930-2003) lhe proporciona. E como tudo de Donen sempre caiu na mais livre imaginação, a fita vai escalando os recursos necessários ao tom do divertimento, inclusive a vantagem de não poupar qualquer malabarismo ou respeito por fatos verídicos.

Cary Grant e Audrey Hepburn, o casal de CHARADA (1963)
Cary Grant e Audrey Hepburn, em frente ao Rio Sena: CHARADA (1963)

A inopinada, fascinante, e feérica desta narrativa de “comédia negra” que não precisaria ir tão longe para usar adequadamente uma fórmula, aprovado dentre os que Hitchcock (talvez o cineasta mais plagiado do mundo) proporcionou aqueles que usaram de seu estilo. Provavelmente, Charada seja o decalque hitchconiano mais assumido, até que Brian de Palma veio praticamente refazer Um Corpo que Cai em Trágica Obsessão, em 1976. Destarte, Donen sorve basicamente o Hitch de Ladrão de Casaca (1955) e Intriga Internacional (1959), cujas relações com Charada se estreitam na presença do mesmo astro principal, Cary Grant, de classe e garbo sofisticado para revestir onde atuou de verniz estilístico, quase inalterável (segundo postura do cronista Paulo Perdigão, já falecido, em crítica sobre Charada ao jornal O Globo, em 25 de agosto de 1985). Quando começa, aliás, com os créditos de Maurice Binder (1925-1991) imitando os de Um Corpo que Cai, Charada já está na trilha certa. Instantaneamente inconfundível. Charada é um redemoinho de truques, trapaças, armadilhas, e reviravoltas. A trama coloca a eterna Bonequinha de Luxo, Audrey Hepburn (1929-1993) no centro de aterradora conspiração de silêncio e ameaças letais.

Audrey Hepburn é Regina Lampert, uma estilista de férias nos Alpes Franceses.
Que de repente, se vê numa intriga de morte e mistério!
Audrey é Regina Lampert, uma estilista de moda que volta de uma temporada de esqui nos Alpes Franceses. Lá, ela conhece o empresário Peter Joshua (vivido por Grant). Ao voltar para Paris, Regina encontra o marido assassinado. Sozinha, passiva e amedrontada, Regina descobre que o marido, durante a II Guerra, havia roubado 250 mil dólares em ouro da Resistência Francesa, e que uma quadrilha está disposta a recuperar o tesouro, usando de todos os meios para faze-la contar o que ela sabe. A esta altura, Regina e a plateia desconfiam de tudo e de todos, inclusive do próprio Peter (com quem tem um envolvimento romântico), ou do Agente da CIA Hamilton Bartholomew (Walter Matthau, 1920-2000), que é incumbido de resolver o caso.

Cary Grant é Peter Joshua, que se torna uma espécie de guardião da viúva Regina, vivida por Audrey. De pé, James Coburn.
O mais inusitado acontece na cena do velório da vítima. Um dos membros da quadrilha que estava presente ao evento chega a espetar um alfinete no cadáver para certificar se está realmente morto. Outra cena marcante é quando uma pistola apavorante é apontada de perto para Regina, mas quando é disparada, nada mais expele do que um jato de água. Há muito movimento e correrias neste espetáculo pelas ruas de Paris, e até uma espécie de brincadeira de “esconde-esconde” pelo metrô.  A verdadeira heroína de toda a história, Regina, vivida com toda maestria e carisma por Audrey Hepburn, escapa por um triz de ser baleada por um pistoleiro sob a arcada da ópera, sem contar três impressionantes assassinatos que tem ao longo da película. São essas mortes o único desvio que o filme vem a sofrer em relação a linha de franco bom humor. 

Peter Joshua enfrenta um dos temíveis bandidos do filme, vivido pelo grandalhão George Kennedy.
Seria necessário tanto sadismo por parte de Donen e de seu roteirista? Quem pode saber, afinal tudo não passa de uma Charada! Apesar disso, a trama traz interlúdios alegres. Charada é um filme pândego, com mistura de riso e pavor, muito peculiar aos trabalhos de Alfred Hitchcock. Cary Grant trava eletrizante luta com o grandalhão George Kennedy, um homem que tem uma garra de aço no lugar de uma das mãos. Grant como Peter Joshua, deixa a luta como vencedor, mas com aparência de quem se tivesse visto frente a frente, nas escorregadias telhas, com um crocodilo feroz.  Entretanto, se mostra valente a ponto de defender Regina do trio violento de assaltantes, vividos por Kennedy, James Coburn, e Ned Glass. Mas a questão é: será que Joshua não pretende dar um bote sujo na pobre Regina? Afinal ela é herdeira do viúvo e Joshua pode pretender pôr as mãos na grana. Será? Quem pode prever? Seria hilário em vermos Grant como “gatuno” em um de seus últimos filmes. 

Joshua se encontra com os três temíveis vilões, vividos respectivamente por James Coburn, George Kennedy, e Ned Glass.
Charada foi totalmente rodado em Paris, exteriores e interiores, e até no mercado de Les Halles, hoje inexistente. Mas Donen confessa uma falha: neste passeio de Bateau Mouche, eles iluminaram apenas um dos lados do rio Sena, assim a projeção de fundo das cenas é sempre a da margem direita, nas cenas em que aparecem Cary e Audrey. É aqui que se ouve a famosa música tema de Henry Mancini (1924-1994), que só teve letra de Johnny Mercer (1909-1976) porque era obrigatório para poder concorrer ao Oscar, o que acabou acontecendo. 

A Luta de vida e morte entre Cary Grant e George Kennedy em CHARADA (1963).
Após a luta, Joshua é cuidado por Regina de seus ferimentos.

Donen confessa que usou um truque, numa cena logo no início do filme: a mão que segura a pistola é de um homem para não revelar a piada. As cenas iniciais foram rodadas num hotel ainda inacabado em Mégeves, Alpes Franceses. Audrey Hepburn, como sempre, vestia modelos de seu figurinista favorito Givenchy e como era seu hábito tinha três cópias de cada vestido. Aliás, figurinos bem realçados pela fotografia de Charles Lang (1902-1998). Cary Grant, embora não aparentasse, completou sessenta anos durante as filmagens e não queria mais ser galã. Foi por isso que a princípio recusou o papel. Não demoraria muito, Grant se aposentadoria das telas de cinema.

Waltter Matthau é o Agente da CIA Hamilton Bartolomew
Audrey e o ator francês Jacques Marin, como um inspetor rumo as investigações.
Vale a pena destacar os atores que fazem os vilões de Charada. Muitos destes eram oriundos da televisão e ainda não eram famosos no cinema, como James Coburn (1928-2002), e George Kennedy (1925-2016) que seria ator ganhador agraciado com o prêmio da Academia, alto e forte como um touro, além de Ned Glass (1906-1984), que havia sido carpinteiro depois de ter seu nome manchado na Lista Negra do McCarthismo. Na trilha musical, Henry Mancini franqueia sofisticação extra a um entretenimento impecável, que nem mesmo Stanley Donen logrou igualar, quando fez dois anos depois Arabesque, segundo sua idêntica concepção. 

CHARADA foi título de inauguração do novo CINE-ODEON, localizado na Cinelândia, Centro do Rio de Janeiro, a 17 de dezembro de 1964. 
Divulgação

FICHA 
TÉCNICA
CHARADA
(Charade)
Ano de Produção – 1963
Gênero: Suspense
Direção: Stanley Donen
Produção: Stanley Donen e James H. Ware, para Universal
Fotografia: Charles Lang, em cores.
Música: Henry Mancini.
Roteiro: Peter Stone, com base em seu argumento.
Metragem: 113 minutos.

Cary Grant e Audrey Hepburn

ELENCO
Cary Grant – Peter Joshua
Audrey Hepburn – Regina Lampert
Walter Matthau - Hamilton Bartholomew
James Coburn – Tex Panthollow
George Kennedy – Herman Scobie
Dominique Minot - Sylvie Gaudet
Ned Glass - Leopold W. Gideon
Jacques Marin – Inspetor Edouard Grandpierre
        Paul Bonifas – Mr. Felix
        Thomas Chelimsky - Jean-Louis Gaudet


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Um Convidado Bem Trapalhão (1968): Blake Edwards faz Peter Sellers promover uma festa de arromba!

UM CONVIDADO BEM TRAPALHÃO ( The Party ) , produzido em 1968, é considerada a comédia mais hilariante do eterno Peter Sellers (1925-19...