Raramente na década de 1950, época em que os filmes Western eram produzidos em alta escala, que Hollywood divulgava o
gênero em tons pacifistas, muito embora alguns cineastas mais avançados como
Anthony Mann (que dirigiu 5 grandes clássicos com James Stewart) lançavam uma releitura ao estilo cinematográfico genuinamente americano. Entretanto, um destes grandes clássicos foi dirigido por outro grande diretor muito famoso, portador de genuínos clássicos do cinema por
excelência, cujo nome é sinônimo de competência: William Wyler (1902-1981).
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O Cineasta William Wyler |
Wyler
certamente foi um dos maiores cineastas do século XX, mas nunca se considerou um autor de filmes e
nunca foi esta a sua pretensão, e por isso era ignorado pela turma francesa do Cahiers du Cinéma, legião esta que,
justamente, inventou o conceito do “cineasta ser o artesão da obra”. Trabalhava
por encomenda sim, muitas vezes para produtores independentes (como Samuel
Goldwyn). Não é possível se detectar um estilo de narrativa, um tipo de
fotografia, ou sequer um ângulo favorito, em que não haja a participação de
Wyler. A única identidade comum entre seus filmes era a excelência, nas
palavras do saudoso crítico de cinema Rubens Ewald Filho. Em verdade, nunca fez um filme ruim, muito
embora haja películas umas melhores do que as outras, mas certamente, grandes
obras cinematograficamente culturais tem seu legado.
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DA TERRA NASCEM OS HOMENS (1958) em exibição nos Estados Unidos.
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DA TERRA NASCEM OS HOMENS (The Big Country, 1958) foi o
primeiro Western a ser, de fato, uma superprodução, pois em 1958, a
televisão invadia os lares americanos (no Brasil, não foi diferente!), lançando muitas séries de faroestes,
como As Aventuras de Rin Tin Tin, The Lone Ranger (Zorro & Tonto),
Paladino do Oeste, Bat Masterson, Gunsmoke, o Homem do Rifle, entre outras - e no entanto,
seria imperioso um investimento alto para não perder a concorrência com a
telinha. Para isto, nada como reunir um
cineasta premiado e de renome internacional, atores consagrados, um compositor
que pudesse prender o espectador com a trilha sonora (o magistral Jerome Moross), e um fotógrafo que pudesse dar todo o panorama que nenhum televisor
poderia enquadrar (Franz Planer).
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Divulgação |
O resultado deste esforço épico foi uma obra de 165 minutos
de duração que custou cinco milhões de dólares, causando grande impacto e
levando o público aos cinemas e, definitivamente, marcou aqueles que o assistiram
por suas cenas de inigualável e impressionante beleza visual. Baseada no conto Ambush at Blanco Canyon de Donald
Hamilton (o mesmo autor de Pecado em
Cada Alma e os livros do espião Matt Helm) e adaptada por Jessamyn West
(1902-1984, autora Sublime Tentação, obra de Wyler realizada em 1956, com Gary Cooper).
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Gregory Peck como Jim McKay, o mocinho de DA TERRA NASCEM OS HOMENS (1958) |
Mas
DA TERRA NASCEM OS HOMENS pretende, de fato, fazer jus ao seu título original.
Se a pretensão do cineasta foi realmente fazer um filme estrondoso, valeu o
espetáculo, pois levou uma história ao seu final sem provocar irritação
irreparável no espectador. Para alguns críticos mais arredios, o fator negativo
do filme reside justamente na sua mania de grandeza. Isto porque a temática da
trama é marcada pela conduta do personagem de Gregory Peck (1916-2003), interessante e válida. Peck como Jim McKay é o herói que recusa-se agir de
acordo com os métodos rudes e ásperos do Velho Oeste, que prova que a razão é
mais superior que a violência. Tudo isso esta provado no argumento do
personagem principal, às vezes um pouco confuso e cansativo na coordenação dos
incidentes da história. Mas mesmo assim, vale o ingresso.
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Jean Simmons como a Professora Julie Maragon |
O
início e o final da fita seguem a fórmula clássica do gênero, com bastante ação
a despertar o interesse do público. Mas o miolo da história se arrasta, assim
como que impregnado pela vastidão enfadonha da planície arenosa, onde a
escassez de água era o motivo de uma sangrenta e invencível divergência entre
dois velhos fazendeiros, vivido respectivamente pelos magistrais Charles Bickford e Burl
Ives.
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Burl Ives como Rufus Hannessey, e seu inimigo caído ao chão, Major Terrill, vivido por Charles Bickford. |
É
certo que THE BIG COUNTRY possui, isoladamente, grandes momentos de criação
cinematográfica motivadas pela mente de William Wyler. O espectador mais atento
poderá observar, por exemplo, que o sentido de vastidão do campo domina toda
obra, graças a esplendida fotografia de Franz Planer.
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Steve Leach, vivido por Charlton Heston, capataz do rancho do Major Terrill, pai de Patricia (Carroll Baker). |
Considerado
o primeiro western de efeito
esplendoroso nas proporções da tela do Techinirama – a começar pelos títulos de
abertura de Saul Bass (1920-1996), ritmados com a música vibrante de Jerome
Moross. Obviamente, em uma tela de televisão o efeito causa menos impacto, mas
o filme impõe-se pelo seu cineasta, pelo elenco e pela temática pacifista,
algo incomum no gênero.
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Divulgação |
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O Major Henry Terrill anunciado o noivado de Jim e Patricia... |
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...enciumando Steve Leach, que gosta da filha de seu patrão. |
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O pacífico Jim McKay em luta com Steve Leach. |
James “Jim” McKay (Gregory Peck), um cavaleiro do
leste e ex marinheiro, vai ao Texas visitar a noiva Patricia Terrill (Caroll
Baker) e encontra uma região abalada pelo conflito de terras: dois barões do
gado, o pai de Patricia, o Major Henry (Charles Bickford, 1889-1967), e Rufus
Hannessey (Burl Ives, 1909-1995) disputam um rancho pertencente a Julie Maragon
(Jean Simmons, 1929-2010) e que possuí a única fonte de água no território.
McKay põe-se ao lado de Julie, e como que não quer nada, vai aos poucos impondo sua
política pacifista num ambiente hostil onde impera a lei da força bruta. O
cavaleiro do Leste terá que provar seu valor ao tentar montar uma cavalo
selvagem, chamar para briga no meio da noite o capataz do rancho dos Terrill,
Steve Leech (Charlton Heston, 1923-2018) após recusar lutar com ele na frente de Patricia,
e para defender Julie lutar com Buck Hannessey (Chuck Connors,
1921-1992), filho de Rufus.
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Gregory Peck e Carroll Baker recebendo instruções do diretor William Wyler. |
William
Wyler e Gregory Peck eram grandes amigos, inclusive é o próprio astro de “A Princesa e o Plebeu” (outra fita de
Wyler) que co-produziu este fascinante superespectáculo Western. Porém, durante
as filmagens, Peck e Wyler se desentenderam feio. Tudo porque Wyler, um
perfeccionista ao extremo, fazia questão de repetir muitas cenas as quais
Gregory Peck, como co-produtor, reprovava e achava que estavam perfeitas. O cineasta disse
a jornalistas – e fazia questão de dizer que falava abertamente para os jornais publicar – que não voltaria a
dirigir o ator nem por um milhão de dólares. Com efeito, ambos jamais voltariam
a se falar, até Wyler falecer em 1981.
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Jean Simmons |
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CAST de DA TERRA NASCEM OS HOMENS. Notem que Jean Simmons não esta nada sorridente! |
Jean Simmons
acabou por aceitar o papel de Julie Maragon, mesmo não tendo simpatias por
William Wyler. Tudo porque Simmons foi a primeira escolha do diretor para ser
a protagonista em A Princesa e o Plebeu ,
mas Wyler voltou atrás e preferiu Audrey Hepburn. Simmons considerou a atitude
de Wyler deselegante, mesmo não havendo ainda um contrato firmado. Contudo, por
razões profissionais, Jean acabou pegando a parte de Julie, mas nunca reatou
amizade com o diretor. A relação era estritamente profissional e ao longo de
sua vida sempre se recusou a falar do cineasta.
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Jerome Moross, compositor da trilha sonora de
DA TERRA NASCEM OS HOMENS (1958) |
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O fotógrafo Franz Planer e Gregory Peck |
Da Terra Nascem os Homens é um western espetacular, valorizado
por marcante comentário musical de Jerome Moross (1913-1983), uma das mais
belas trilhas do gênero que segura todo o espetáculo. Valorizado também pela bela
fotografia do austro-húngaro Franz Planer (1894-1963), o mesmo que fotografou Bonequinha de Luxo, A Princesa e o Plebeu, e Rei dos Reis.
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Charlton Heston |
Charlton
Heston já era consagrado após o clássico Os Dez Mandamentos (1956), dirigido por Cecil B De Mille, porém teve que submeter-se a um “teste” com Wyler. DeMille sempre gostou de Heston e sugeriu a
Wyler que desse ao astro de O Maior
Espetáculo da Terra um dos papéis centrais. Até então, Heston havia feito sempre
papéis de heróis, inclusive em westerns, e sem contar que o ator ainda estava
estigmatizado pela crítica como canastrão
comparado a Victor Mature, no início da carreira.
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Charlton Heston em AS AVENTURAS DE BUFFALO BILL em 1953. |
Wyler deu a
Heston o papel do antipático e rude Steve Leach, personagem comparado a um vilão. De
início, o ator queria recusar o papel do capataz por achar que era pequeno,
mas seu agente convenceu-o de que valeria a pena pela oportunidade de trabalhar
ao lado de Gregory Peck, e sob a direção de William Wyler. Felizmente, Heston
aceitou o conselho de seu agente, e para sua felicidade (e a do público e de seus fãs!),
Wyler gostou tanto de seu desempenho que o pôs no ano seguinte para seu próximo filme, talvez um dos mais importantes do cineasta, Ben-Hur, com Charlton Heston como astro principal, outorgando grande responsabilidade na superprodução, que rendeu 11 premiações na Academia, incluindo um como Melhor Ator para Heston.
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O diretor William Wyler e a atriz Carroll Baker. |
Carroll
Baker chegou a ter também uma carreira longa, e anos depois, confessou que se tornou
amante de produtor para subir em Hollywood, mas depois se arrependeu e foi
estudar no Actor´s Studio onde
encantou Elia Kazan que a usou como Baby
Doll (1955), filme polêmico. Teve
muitas chances no cinema, foi dirigida por John Ford (Crepúsculo de Uma Raça, 1962) e mesmo pelo nosso Hector
Babenco (1946-2016) em Ironweed, em 1987, Muito estranho e inexplicável o sumiço de Baker no roteiro de Da Terra Nascem os Homens perto ao fim da história, pois sua personagem fica ausente da luta final.
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O ator mexicano Alfonso Bedoya, em seu último trabalho no cinema. |
Destaque também para o ator mexicano Alfonso Bedoya (1904-1957), falecido aos 53
anos por problemas relacionados ao álcool, que sequer chegou a ver o filme lançado. Bendoya foi o melhor de todos os atores mexicanos fazendo tipos
característicos no cinema norte-americano, o primeiro deles em O Tesouro de
Sierra Madre (1949, de John Huston), onde roubou muitas cenas até mesmo do astro principal, Humphrey Bogart. Em Da Terra Nascem os Homens, ele faz
o papel do empregado dos Tirrell, Ramón Guiteras, que acaba tornando-se uma
espécie de “Sancho Pança” para o personagem de Gregory Peck. Ramón
abandona os Tirrell para servir a Mckay e avisa-lhe dos perigos que corre. Na última cena, ele parte com o herói e Julie, dando a entender que
seguirá seu destino com os dois. Nota-se um dublê de costas no lugar de Bendoya, que morreu antes do término das filmagens.
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Burl Ives ganhou o Oscar de melhor ator coadjuvante por sua atuação em DA TERRA NASCEM OS HOMENS (1958). |
Burl Ives
era um ator de múltiplos talentos, pois também era radialista, cantor, escritor e músico. Começou a vida como esportista, sendo jogador de futebol americano,
mas foi inserido no mundo da música, tornando-se um cantor de Folk e baladas, gravando mais de 30
álbuns para Decca e 12 para a gravadora Colúmbia. Sua carreira de ator começou
na Broadway, onde é mais lembrado pelo público americano no papel de Big Daddy
na versão de Gata em Teto de Zinco
Quente, em 1938, papel que repetiria na versão cinematográfica de 1959 com
Elizabeth Taylor e Paul Newman - mas somente em 1946 foi introduzido em
Hollywood com Furacão Negro (Smoky) com Fred MacMurray e Anne Baxter.
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O cantor Burl Ives |
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Burl Ives também era cantor e gravou inúmeros Long Plays. |
Ives ficou
notável como o rústico patriarca Buck Hannassey, o que valeu-lhe o Oscar como Melhor Ator Coadjuvante. Nesta época, ele já encontrava-se semi-aposentado do show business, mas com o Oscar conquistado,
muitas outras oportunidades se abriram para este gigante em todos os sentidos,
seja na estatura física e no talento. Quando em 1989, aos 80 anos de idade, anunciou
definitivamente sua aposentadoria, veio a estabelecer-se em Anacortes,
Washington, com sua família, muito embora fizesse até quase ao fim da vida
shows beneficentes. Um ano antes de seu falecimento, foi introduzido no Hall da Fama DeMolay, pois era um Grão
Mestre da Maçonaria, grau 33 (o máximo), e toda sua família era vinda de maçons.
Assim ele dizia:
Tive a sorte de nascer em uma família
de maçons. Na verdade, minha irmã mais velha, Audrey, era matrona Grande da
Ordem da Estrela do Oriente, em Illinois. Minha experiência DeMolay veio muito
naturalmente por causa do meu pai e irmãos. Assim foi a minha juventude
reforçada.
Burl Ives
morreu em 14 de abril de 1995 aos 85 anos.
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Divulgação do filme nos jornais cariocas, em exibição pelas salas do Rio de Janeiro. |
FICHA
TÉCNICA
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Gregory Peck e Jean Simmons |
País – Estados Unidos
Ano – 1958
Gênero - WESTERN
Direção – William
Wyler
Produção – William
Wyler, Robert Wyler e Gregory Peck, em produção e distribuição pela United
Artists
Roteiro - James R.
Webb, Sy Bartlett, Robert Wilder, com adaptação de Jessamyn West e Robert
Wyler, com base na história de Donald Hamilton.
Fotografia – Franz
Planer, em Cores.
Música – Jerome
Moross
Metragem – 165
minutos.
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Chuck Connors, Burl Ives e Gregory Peck |
Gregory Peck – James McKay
Jean Simmons - Julie Maragon
Carroll Baker - Patricia Terrill
Charlton Heston - Steve Leach
Burl Ives - Rufus Hannassey
Charles Bickford - Major Henry Terrill
Alfonso Bedoya - Ramón Guiteras
Chuck Connors - Buck Hannassey
Chuck Hayward - Rafe Hannassey
Buff Brady - Dude Hannassey
Dorothy Adams- Mulher da família Hannassey
Chuck Roberson - Vaqueiro dos Terrill
Bob Morgan - Vaqueiro dos Terrill
John McKee - Vaqueiro dos Terrill
Slim Talbot - Vaqueiro dos Terrill
Jim Burk - Blackie / Cracker
Hannassey
Carey Paul Peck - Garoto de 11 anos
Jonathan Peck - Garoto de 14 anos
Ralph Sanford - Convidado na festa
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